“O homem não sente medo, sente receio”. Pelo menos era nisso que o homem queria acreditar, mas naquela situação especifica estava difícil de crer nisso.
Sentado em um restaurante caro do centro da cidade, olhando profundamente para os olhos da mulher de vestido vermelho na sua frente, não conseguia falar nada. Nunca teve medo de falar com mulheres, na verdade se dava muito bem com elas, mas agora era diferente. Achava que entre uma garfada e um gole de vinho tinto, o faria fazer o que tinha que ser feito com mais facilidade, mas só o fez pensar sobre o que estava sentido naquele momento.
O medo talvez fosse o primeiro sentimento que o homem em sua real essência sentia. Até então ele estava em um lugar quente e acolhedor, não sabe o significado do sofrimento, quando de repente ele é forçado a sair por um lugar bem menor do que sua cabeça e com palmas nos glúteos que ele conhece o mundo e todas as suas dificuldades. Isso é um aviso. Um aviso sobre a vida, de que nada a partir de agora será fácil.
Você vai sentir medo pra sempre.
O desconhecido é a principal matéria prima de todos os medos. Não precisaria nem de pesquisas para saber que o maior deles, é a morte, cujo está diretamente relacionado ao medo do escuro. Assim como não sabemos o que encontrar quando as luzes se apagam, também não sabemos o que encontrar nos minutos subsequentes as nossas próprias mortes.
Mas durante a infância ele nunca sentiu medo da morte. Sabia que uma hora ou outra isso iria acontecer com todos ao seu redor. Naquela época seus reais medos eram os da ficção. Sua mãe não podia desligar a luz, e ele não podia ver filmes de terror, tinha um medo absurdo de abrir o armário ou olhar debaixo da cama. O medo não era da morte, e sim do que os mortos podiam fazer.
- Não precisa ter medo dos mortos, e sim dos vivos. – Foi o que sua mãe disse no dia do velório do seu avô. Sua mãe era uma mulher esperta.
Naquele dia ele sentiu outro medo, o medo de ficar sozinho.
Pois foi assim que ele se sentiu após seu avô morrer. Ele era apenas uma criança, mas já não se sentia mais completo. A vida lhe tinha tirado seu mentor, seu herói, seu avô. Depois disso foi difícil até mesmo de se relacionar com outras pessoas, ele jamais superaria esse fato, apenas aprendeu a lidar com isso.
Aquele também foi o dia que ele dividiu seus medos antigos dos novos medos. Não sentia mais medo quando sua mãe desligava as luzes, podia ver um filme de terror sem problemas, e no armário não tinha mais monstros, apenas roupas. A realidade é dura demais para ainda ter tempo de se criar novos medos. E isso ficou ainda mais claro, quando ainda no colégio dormiu na casa de seu melhor amigo.
Foi com muita insistência de sua própria mãe, que ele saiu de sua casa num sábado à tarde em direção ao interior da cidade. A casa de veraneio seu amigo era cheia de arvores, e tinha um pequeno lago que dava origem a um pequeno riozinho que circulava a região. Era uma bela casa.
Nas suas aventuras de crianças, a aposta da noite foi: quem conseguia ficar mais tempo acordado. Já passava da hora do lobo, quando eles foram ao quintal com a esperança de ver o nascer do sol. Mas as sombras das arvores junto com uma tensa neblina provocava uma escuridão tão profunda e densa, que era impossível ver alguma coisa além de dois metros dos seus olhos.
- O que você faria se saísse um monstro daquele lago? – perguntou o garoto para o amigo dono da casa, olhando para a água.
E ele prontamente respondeu.
- O que você faria se aparecesse um homem atrás de você?
A possibilidade do amigo era muito mais apavorante da qual à que ele tinha sugerido. Bem como sua mãe havia dito. Maior do que o medo da morte ou o medo de ficar sozinho era o medo dos homens.
Mas agora ele não era mais um garotinho. Não podia mais sentir medo, ou se sentisse, não poderia demonstrar. Principalmente naquele momento.
O lugar era perfeito, tinha que admitir. Ficou com medo de errar, mas todo mundo gosta de comida italiana, e na pior das hipóteses iriam comer macarrão com queijo, mas não foi o que aconteceu. Estava tremendo por dentro, mas já tinha combinado com os músicos e o dono do restaurante, nada podia dar errado agora.
Fez o sinal que tinham combinado para os músicos virem à sua mesa. E mesmo com as pernas tremendo, ficou de joelhos e levantou a pequena caixa onde estavam as alianças, e olhou tão profundamente nos olhos da mulher que amava que conseguiu sentir a alma dela, e acabou de descobrir que ela estava tão assustada quanto ele naquele momento.
Depois que ela respondeu, ele não sentiu mais medo de ficar sozinho.
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